Friday, January 04, 2013

A Lição de Adão


ou A Escolha de Adrielly

Aos dez anos do governo de Salazar, ele encomendou uma série de cartazes que foram distribuídos por todas as escolas primárias de Portugal. Tais cartazes tinham como objetivo incutir nos jovens as idéias salazaristas, glorificando o trabalho do ditador, através de comparações entre as condições em Portugal antes e depois do início da ditadura de Salazar.

É o mesmo argumento que alguns usam, no Brasil, em relação à Ditadura Militar.

Já em A Escolha de "Sofia", na verdade, é um dilema: uma mãe polonesa, filha de pai anti-semita, presa num campo de concentração durante a Segunda Guerra é forçada por um soldado nazista a escolher um de seus dois filhos para ser morto. Se ela se recusasse a escolher um, ambos seriam mortos.

É o tal do "se ficar o bicho pega, se correr o bicho come", onde ambas as condições são ruins, cada qual à sua maneira.

No caso do artigo do Elio Gaspari - justo o Elio Gaspari? - ele vem com uma lição, que tenta ser de moral, no neurocirurgião Adão Crespo, do Hospital Salgado Filho, no Rio de Janeiro, sobre o caso da menina Adrielly dos Santos, citando outro médico, Antonio Ribeiro Netto (A lição de Antonio Ribeiro Netto).

É o que eu sempre digo: algumas profissões não são feitas para se ganhar dinheiro. Médico é uma delas... o sujeito precisa vestir a camisa mesmo! Adão não vestiu... o neurocirurgião declarou que vinha faltando aos plantões já há um mês, em retaliação ao hospital, que deveria manter dois plantonistas, mas mantinha apenas Adão. E segundo Adão, tudo foi devidamente comunicado ao seu superior.

Outras categorias praticam a tal da "greve branca", ou "operação tartaruga". E médico, pode fazer greve? Claro que não, dirão, afoitos! É por isso mesmo que hospitais da rede pública montam em cima dos coitados... sim, coitados, que trabalham horas a fio por salários de fome, sem condições de trabalho e, claramente caracterizado no caso de Adão, trabalhando literalmente por dois!

Se Adão soubesse que naquela noite daria entrada no hospital uma garotinha de 10 anos, com uma bala alojada na cabeça, ele faltaria ao plantão? Claro que não! Mas também o chefe de Adão, se soubesse do caso, também poria um segundo profissional no plantão, como, afinal, determina o Conselho Regional de Medicina.

Eu chamaria isso de A Lição de Adão! Lição para o prefeito, para o Conselho Regional de Medicina, para o hospital, e para o cidadão: não escolha ir a um hospital em dia de festa, fim de semana ou feriado... essa seria A Escolha de Adrielly, se ela pudesse escolher. Não ser baleada, primeiro, mas na fatalidade de ser, que seja em dia útil!

Médico também é filho de deus, e como tal também merece passar tais datas com a família. Mas aí, para que não haja interrupções, como em várias outras profissões hoje em dia ditas "24 por 7", existem as escalas, onde 2 ou mais funcionários revesam-se entre sí os feriados: se um trabalha no Natal, o outro trabalha no Ano Novo, o outro no Carnaval, etc, etc. Mas sendo um só, o infeliz do Adão não teve esse direito! E como protestar, quando ninguém lhe dá ouvido? Retaliando. E está assim formado o palco para a tragédia!

É, a medicina pública do Rio pratica genocídio, sim. E todos esses políticos que aí estão, desde o prefeito até o chefe imediato de Adão, não passam de delinquentes. Se não têm funcionários, abaixem as portas! Seria mais digno, ao menos não dariam a impressão de condizirem um hospital onde têm um galpão com parcos equipamentos.

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