O ex-ministro da Fazenda do governo Sarney, Luiz Carlos Bresser-Pereira, decretou o "fim da onda neoliberal" em artigo na Folha de São Paulo do dia 21 de Abril passado. Clóvis Rossi, jornalista, colunista e membro do conselho editorial do jornal tentou nos mostrar no dia seguinte, que não há morte sem defunto, querendo crer que o neoliberalismo continua hígido (sic) como sempre. Quem estaria certo?
NINGUÉM!!!
Desde o começo dessa onda, a patuléia não entendeu direito o que leu... ou se entendeu, resolveu mudar a história talvez para deixar a coisa mais interessante... mais atraente - coisa de marketeiro! Nem o "elegante" Terceira Via" pegou tanto quanto o famigerado "Neoliberal".
Como ensinou Paul Hugon na sua "História das Doutrinas Econômicas", neoliberalismo, na verdade, é aquela doutrina que prega a prática de um Estado interventor e regulador, justamente o oposto desta praticada pelo hegemônico sistema dos ianques do norte (os estadosunidenses, mas com culpa também no cartório da humanidade aqueles outros mais ao leste, chamados reinos-unidenses), e por conseguinte seguida por todo o mundis novus, e assim também adotada pelo país das terras brasilis - também conhecido como pindorama, terra do brasil, ou só brasil minúsculo, já que exime respeito.
De volta à tal doutrina, a tal ideologia reacionária que visava reformar o capitalismo global para fazê-lo voltar aos tempos do capitalismo liberal do século XIX deveria chamar-se sim Liberalismo de Mercado - se muito. Não passa (ou passou) de uma releitura (nada se perde, tudo se transforma) do chamado Liberalismo Clássico, doutrina do pensamento econômico que teve seu auge em meados do século XVIII, nas idéias de Hume, Smith e Kant.
Nos tempos de pós-graduação em Comunicação Social, costumávamos brigar muito pelas má-interpretações da história. Por fim elas ganharam popularidade mesmo, pois de tanto se bater na tecla - simplesmente trocaram os nomes das coisas! - o que sempre fora preto passou a chamar-se branco, e o que sempre fora branco passou a chamar-se preto.
Longe da discussão se o neoliberalismo - ou como quer que se chame esta doutrina econômica - morreu ou não, temos José Saramago, em seu recluso retiro na Ilhas de Lanzarote, chorando noutro enterro que deveríamos nos preocupar muito mais: o da Justiça, que já anda falecida há muito.
E não só a Justiça, clama ele, que já sabemos morta há tempos, mas também a Democracia, esta milenária senhora sofisticadíssima que anda tão em baixa, ingenuamente criada por uns atenienses mais ingênuos ainda, sob o lema
do povo, pelo povo, para o povo... puro dislate!
E se sabemos exercer a democracia, sim, é através do voto direto, partícula mínima de soberania que nos reconhece como participantes ao elegermos nossos representantes no governo. É exatamente aí que a representação da nossa democracia começa, mas também é aonde ela acaba... Podemos por e tirar presidentes, mas nosso voto nunca terá nenhum efeito, mínimo que seja, na verdadeira máquina de poder do mundo, e conseqüentemente, nenhum efeito no meu ou no seu país, nem em nossas cidades, talvez nem em você mesmo: a tal da máquina do poder econômico!
E à morte da Democracia devemos chorar, então! Sem Democracia estamos impossibilitados de toda e qualquer outra ação. Mesmo que a Justiça estivesse viva, nada poderíamos contra o poder econômico e suas estratégias de domínio que nada têm que ver com aquele bem comum que a Democracia aspira. É deste ponto-de-vista que Bresser Pereira está certo e Clóvis Rossi equivocado. Os fatos ocorridos nas últimas semanas que, segundo Bresser Pereira, marcam o fim inglório do neoliberalismo, não são as primeiras - socorro a bancos e revoltas populares pelo aumento dos preços - nem serão as últimas, preconizando o fim inglório do
coisa-ruim.
E mesmo assim, a contradição dos avanços políticos e institucionais que transformaram o Estado democrático e social da segunda metade do século 20, ainda sucumbe-se perante o poderio econômico, a discutir-se a morte ou não do neoliberalismo! Ora, tanto faz! Apocalípticos e Integrados teriam seus próprios argumentos: estes bradariam "morreu para você, que é ingrato"; enquanto aqueles diriam que "não morreu porque simplesmente nunca existiu".
Eu fico aqui de trás, observando e aplaudindo o burlesco, chorando num misto de dor e pena, a gastar horas insanas neste debruçar quase corcunda de inutilidade da palavra... Um minuto de silêncio, pois o sino vai tocar mais uma vez, anunciando outra morte de ninguém... Ouçamo-lo, por favor.